Memorias do carcere, Volume 2[em Casa de] Viuva Moré, 1864 |
Popular passages
Page 130 - Pedi aos contemporâneos que o conheceram notícias e miudezas, a fim de entrar de consciência naquele trabalho. Escrevi o romance em quinze dias, os mais atormentados da minha vida. Tão horrorizada tenho deles a memória, que nunca mais abrirei o Amor de perdição, nem lhe passarei a lima sobre os defeitos nas edições futuras, se é que não saiu tolhiço incorrigível da primeira. Não sei se lá digo que meu tio Simão chorava, e menos sei se o leitor chorou com ele. De mim lhe...
Page 215 - Joaquim Xavier Pacheco, me asseverou que vira uma carta de Lisboa, dizendo que o senhor Conde da Ponte me ia enviar dois contos de reis por ordem "do rei, apressei-me a desmentir a calumnia, ou a rebater a esmola sem mais vaidade que a do trabalho, que a si se basta.
Page 214 - O rei entrou, ea senhora foi chamada do corredor onde tinha o seu asilo de trabalho. Com a senhora veio um menino nos braços de sua ama. D. Pedro V cumprimentou a presa, perguntando-lhe o tempo de sua prisão. Reparou no menino, e acarinhou-o, perguntando-lhe o nome ea idade. A mãe respondeu pela criancinha, eo rei deteve-se a contemplar a infeliz. Ao lado do monarca compungido, estava o senhor marquês de Loulé, pensando, porventura, que naquele dia tinha de banquetear-se no palácio de uma irmã...
Page 127 - Leonor, da mão da qual eu me deixaria cahir no abysmo, se para cada homem pudessem abrir-se as fauces de dois abysmos. Aquclle padre, como todos os bons padres dos meus romances, — e creio que os fiz sempre bons para andar sempre ao invez da verdade — copiei-o d'uma excepção, como outras excepções, que o leitor conhece.
Page 215 - Dissera-se que eu recebera dois contos de reis, dádiva do soberano. Os meus amigos perguntavam-me se os recebera, como certíssimos de que eu os enganava respondendo negativamente. Dei o boato como inventado no Porto, e ponderei-o como todas as calúnias que por aqui me assaltam, e eu esmago entre a sola ea lama.
Page 127 - Do livro publicado com o titulo Doze casamentos felizes escrevi seis ou sete na cadêa. Senti prazer n'aquellas ficções, e orgulhei-me de ter n'ellas imaginado a vida como ella podia ser, sem desbarato do divino engenho que bafejou o lodo dos corações. Dediquei o livro ao senhor Antonio Rodrigues Sampaio, que exercita a virtude da amizade, como se esta de per' si abarcasse todos os dictames do Evangelho.
Page 216 - Enganei-me. O senhor D. Pedro V era um anjo: não sei dar-lhe outro nome. Foram estas as suas palavras : — Ainda aqui está ? ! — E estarei amarrado com correntes de ouro áquelles varões de ferro. Deteve-se a pensar, e olhou para dois cavalheiros que estavam comigo. Depois me disse o que já referi concernente ao...
Page 129 - O romance escripto em seguimento d'aquelle, foi o Amor de perdição. Desde menino eu ouvia contar a triste historia de meu tio paterno, Simão Antonio Botelho. Minha tia, irman d'elle, solicitada por minha curiosidade romanesca, estava sempre prompta a repetir o facto, alligado á sua mocidade.
Page 60 - Formou pois o Senhor Deus ao homem do limo « da terra, e assoprou sobre o seu rosto um assopro « de vida ; e recebeu o homem alma e vida.
Page 122 - ... bosquejadas. Abstenho-me de dizer que seria possível restituí-las sanadas à humanidade, porque desadoro utopias, e sinto-me convictamente materialista na perversão de certos indivíduos. Direi, todavia, que o descaridoso gravame que flagela o preso, se uma justiça misericordiosa o não aliviar, a cadeia continuará a ser um como fogo a que se aquilata a extrema maldade do criminoso.